#107 – The luna de miel is over

Barcelona, terça fritopan de verão, e, bom, a lua de mel com o pós-pandemia começa a azedar.

The Last Weeks of the Semester According to RuPaul's Drag Race ...

Retrospectiva rápida, para os viajantes asimovianos de outras galáxias:

  • 14 de março: o governo español declara o estado de emergência diante do aumento de casos de Covid.
  • abril: ápice de casos, com o recorde de 950 mortes em um único dia, ou 2 por 100 mil habitantes.
  • maio: início do desconfinamento escalonado em todo o país.
  • junho: Nova Normalidade. Sensação de modess carefree, liberté igualité fraternité, Vírus Nunca Mais, oba-vamo-pa-praia-todo-mundo-de-uma-vez. Bares cheios, e o povo parece beber, festejar e acumular cascos de cerveja sobre as mesinhas de metal dos buteco como se nunca.
  • julho: começamos o mês com uns 30 novos surtos, e duas semanas depois já temos uma centena em todo o território.

A maioria de focos deriva das fatídicas reuniões domésticas/familiares/festinhas e tem sido controlada por quarentena seletiva de infectados e as chamadas ´pessoas de contato´.

Outros, porém, estão começando a sair do controle.

baby one more time britney spears gif | WiffleGif

É o caso dos contágios entre os ´temporeros´, trabalhadores temporários de diferentes nacionalidades que costumam vir à Espanha a partir de abril/maio para a colheita de frutas.

Muitos são imigrantes ilegais ou têm medo de ficar sem trabalho, e portanto se recusam a fazer o teste.

Resultado: super double shitty dificuldade na hora de identificar e controlar os contágios (os testes são voluntários, e não há atualmente mecanismo que force o serhumanus a realizá-lo contra sua vontade) >> zica se agravando vertiginosamente.

Além do mais, diversos trabalhadores entrevistados dizem que, se tivessem que se confinar, não teriam onde se meter — muitos vivem temporariamente na rua ou em apartamentos divididos com 10, 20, às vezes até 30 pessoas.

Mas a situação extrema entre os atuais surtos secundários pós-desconfinamento se encontra na região catalã de Segrià, perto de Aragón. 209 mil habitantes em 2 mil quilômetros quadrados. Mal bate a população de Cachoeiro do Itapemirim, no Espírito Santo, ou Santa Bárbara do Oeste, em Sumpalo, de onde por sinal vem um amigo muito querido que fala com os RRRR delícia do interioRRRR e cujo apelido, desde a época da faculdade, é Pé (de Pé Na Cova).

Amácio Mazzaropi – DE OLHO NA TELINHA!

But I digress.

Em Segrià, desde o início da pandemia até agora houve/há 3.447 casos confirmados de coronavírus, com 151 novos registros apenas nas últimas 24 horas (aka 71,7 por 100 mil habitantes). Em apenas duas semanas entre junho e julho, os casos notificados se multiplicaram por 7, com notável aumento entre a população jovem, os mais rebeldes no cumprimento de medidas simples como uso de máscara e distanciamento social.

Os contágios em Segrià correspondem a 1/3 de todos os da Catalunha, que contabiliza retumbantes 745 novos casos desde ontem.

E a novela está em curso: contrariando o governo da Catalunha, que desejava isolar a região por meio de um decreto de estado de alarme, ontem uma juíza disse que não, que isso era competência do governo central; em seguida, a própria vice-presidenta do dito contestou a decisão judicial e declarou seu apoio à Catalunha; ao que Quim Torra, o governador catalão, mandou uma mensagem a Segrià dizendo que por ora ´recomendava´ o confinamento. Isso tudo esta semana.

Fast forward pra hoje e temos em Segrià a população e os policiais confusos diante de bares e negócios abertos e um monte de gente na rua. Um agente assim resumiu a situação a um jornal local:

“Isso é uma zona, aqui ninguém sabe o que se deve fazer e cada um faz o que quer”.

“Keke custa botar a máscara e se separar das pessoas por uns dias?”, indignava-se um médico de um hospital local trabalhando com pacientes de Covid. A ocupação dos leitos ainda é administrável, mas está subindo a cada dia.

A essa pendenga, talvez a mais preocupante do país no momento, se soma, por exemplo, um novo surto em L´Hospitalet de Llobregat, cidade-dormitório com a maior densidade demográfica da Catalunha, colada com Barcelona. Oh-oh apaches.

Uma amiga, que trabalha em um consultório dental local,disse: tô sentindo que vão voltar a fechar a clínica. Ontem, 8 dos 15 pacientes agendados simplesmente não vieram. “Mas como assim, eles tinham corona?”, pergunto. “Não falaram nada. Só um telefonou avisando que tinha febre”, disse.

Hoje, me ligou um amigo català que mora no município e trabalha na prefeitura. Com su modus irônico típico, me conta que acaba de receber o resultado do teste PCR, oferecido para os funcionários, “e vaya decepción, no he pasado el corona”. Pergunto se estava sentindo alguma coisa esses dias, e ele, que sempre está me azucrinando sobre o doidivano do presidêncio do Brasil, emendou: “pois os sintomas eram estes: un resfriadinho (sim, ele, como outros gringos, já aprenderam portuguezinho com o Bolsillonaro)! Nada grave”.

Bolsonaro máscara torta - Imgflip

Eu comento que outro dia alguém me fez um comentário que eu classificaria de infeliz, embora, quero crer, não mal-intencionado: “Susana, acontece de tudo com você! Câncer, coronavírus….!”.

Vaya gradação de Cousas Megatônicas postas num mesmo saco imaginário. Meu amigo, que é sarcástico, mas um doce de membrillo, me consola: “é verdade, mas, como todo mundo sabe, hay que pasarlo mal para después pasarlo bien, e você já passou quase todo o mal. Grandes aventuras y alegrías te esperan ahead” (sic).

Nos esperam. Que a fé não pode faiá, diz o arautus. O non?

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